O que choca nesta tragédia do Haiti é a dimensão. Dezenas de milhares de mortos, cidades inteiras arrasadas, um mundo de gente em condições miseráveis e caóticas, enfim, uma catástrofe de proporções inimagináveis que causa perplexidade. Também o efeito mundial – são 23 países junto com o Brasil que contabilizam mortos e desaparecidos. Este é o ingrediente que chama a atenção: é uma tragédia titânica e global. Parecida com o atentado contra as Torres Gêmeas que matou gente de 60 países. Só que ali foi no coração da riqueza, enquanto que nessa ilha caribenha, no coração da pobreza.
Mas o Haiti logo estará esquecido. Afinal, a vida continua. E a morte também. Cada qual preocupado com o seu terremoto, com a sua sobrevivência. É claro, com exceções. Existem Zildas Arns, soldados da ONU, voluntários. Pois neste mundo há duas realidades conflagradas, algo parecido com o que acontece ali mesmo no Haiti. Cerca de cem quilômetros da zona devastada, na costa norte haitiana, luxuosos transatlânticos atracam em praias paradisíacas, com turistas comendo do bom e do melhor, enquanto sobreviventes brigam por água e comida em meio aos escombros. Mas, pensando bem, qual a diferença de cem ou dez mil quilômetros? A maioria de nós não está de férias, na beira de uma praia, comendo e bebendo? Ou protegido numa “barca de Noé” longe de qualquer tragédia, enquanto muita gente padece bem ao lado? Na verdade, o Haiti está em todo lugar e bem próximo de cada um, neste mundo que treme e sofre. O que se pode fazer?
Jesus disse o que pode ser feito na parábola do bom samaritano (Lucas 10.25-37). Diz a história que enquanto o sacerdote e o levita – pessoas de religião, mas sem a prática do amor – evitaram um moribundo que tinha sido assaltado, o samaritano acudiu-o gastando tempo e dinheiro. “Pois vá e faça a mesma coisa”, respondeu Jesus a um fariseu que precisava ouvir esta história. Pois no caminho de cada um cruzam pessoas soterradas e que necessitam urgentemente de resgate. Não podemos reconstruir a vida delas nem salvar o mundo. Mas podemos retirar algumas pedras e oferecer o mínimo de ajuda.
E se nestas horas ainda surge arrogância de que é castigo, ou blasfêmias contra a justiça divina, cabe ouvir o que escreve o mesmo evangelista. Pessoas chegaram a Jesus com “santa” satisfação comentando uma tragédia. O Salvador foi enérgico: “ – Vocês pensam que, se aqueles galileus foram mortos desse jeito, isso quer dizer que eles pecaram mais do que os outros galileus? De modo nenhum! Eu afirmo a vocês que, se não se arrependerem dos seus pecados, todos vocês vão morrer como eles morreram” (Lucas 13.2-3). Sem comentários!
Catástrofes irão acontecer enquanto o mundo será mundo. E ninguém está livre. Se não estivermos sob os escombros, que tenhamos o sentimento de compaixão e de responsabilidade. E a decisão de socorrer.
pastor luterano
Comunidade São Paulo, Novo Hamburgo, RS
21 de janeiro de 2010
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